"Populus vult decipi, ergo decipiatur", já lá dizia Quintus Aurelius Stultus, senador romano...
domingo, 31 de dezembro de 2017
• A passagem de ano
Não há um “Antes e Depois” na noite de passagem de ano. Nada muda. Absolutamente nada.
É só uma paragem forçada. É um virar de folha de calendário igual ás outras todas mas que queremos, por convenção, que seja diferente de todas as outras. À força toda.
Os verdadeiros “Antes e Depois” tanto podem acontecer no dia 31 de Dezembro como no dia 1 de Janeiro como em todos os outros 363 dias do ano.
Um grande incêndio, a descoberta de uma nova mina de ouro ou diamantes, um terramoto avassalador, a definitiva cura ou erradicação de uma doença, um tsunami diluviano, uma revolução social, o nascimento de um novo Messias…
Tudo isto pode sobrevir em qualquer altura. O destino não espera por datas específicas determinadas pelos humanos.
E por falar em nascimentos… Cada nascimento, happening feliz, implica anos mais tarde uma morte a mais, evento infeliz.
Todos ouvimos no dia 1 de Janeiro as notícias de quem foi o primeiro bebé do ano. Mas já alguma vez ouviram uma vez só algum noticiário que nos informasse quem foi o último homem a falecer o mais perto possível da meia-noite dum dia 31 de Dezembro? A última morte do ano que também morre num segundo?…
Ninguém desejará ficar em último lugar nessa corrida. Até porque ninguém dará pela sua partida. São os falecidos em que menos gente repara. Estamos todos distraídos a olhar fixamente para os ponteiros do relógio. Que não se mexem de forma nada diferente do resto do ano, afinal de contas…
Nada muda nesse segundo em que se atingem as 24 horas de 31 de Dezembro e começa um novo ciclo com o mesmo número de horas, exactamente igual.
Mas as pessoas querem todas parar para sonhar uma beka. Deixemo-las pois festejar e crer na ilusão que algo vai mudar sem a sua própria acção e determinação. Que haverá algum dedo divino mais atento ao calendário, quiçá.
O pior é que os actos divinos costumam ser caprichosos… Tanto dão para um lado como para o outro. Tanto nos podem bafejar com alegria desmedida como nos dar provas que shit happens, too. De quando em vez. E em grande.
Para mim, tudo mudou, há dois anos atrás. Não no dia primeiro do ano mas quase a meio desse 2015. E ainda tive de esperar o princípio do último trimestre para essa mudança se materializar.
Portanto, o “Antes e Depois” de cada um de nós não tem de ser obrigatoriamente na noite de passagem do ano.
Mas a malta quer toda fingir na vigília dessa madrugada que vai correr tudo bem daqui para a frente, não é?… Vamos lá então fingir, pois!…
"Populus vult decipi, ergo decipiatur", já lá dizia Quintus Aurelius Stultus, senador romano...
"Populus vult decipi, ergo decipiatur", já lá dizia Quintus Aurelius Stultus, senador romano...
Eu só queria mesmo - já agora que é noite de formular desejos - era ter esse alguém a meu lado com quem mais gostaria de partilhar uma flute de champagne. Ou um belo dum hot glõgi.
segunda-feira, 18 de dezembro de 2017
• Per una Catalunya lliure
Vai ser na próxima quinta-feira, dia 21, que um novo 1º de Dezembro pode ter uma reprise. E desta vez sem ser necessário defenestrar um qualquer Miguel de Vasconcelos.
Menos mal. No anno da graça de Mil Seiscentos e Quarenta não havia cá referendos. Eram tempos mais bárbaros. Hoje as coisas podem resolver-se com papelinhos enfiados em urnas.
Ainda que actualmente possamos parecer mais civilizados e sobretudo democráticos, persistem contudo umas pequenas bizarrias. Como delitos de opinião poderem condenar um homem a 30 anos de cadeia no país aqui ao lado de nuestros hermanos, por supuesto.
Não entendo como é possível que a lei fundamental de Espanha, a sua constituição, blinde a possibilidade das diferentes nações que a compõem, qual mosaico, julgarem unilateralmente acerca do seu destino. Como é que tal regra foi aprovada?… Como é que não a contestam hoje?…
Eu ao menos não ouço essas vozes, se é que existem. Nem essas lá em Barcelona, nem outras que deveriam clamar aqui em Lisboa pelo seu apoio por uma Catalunha livre… Então nós tivemos direito ao nosso 1640, à nossa restauração da independência face a esses reis Felipes merengues e não se ouve nenhum tuga dizer de sua justiça que os catalães deveriam merecer o mesmo?…
Só se ouve por aí alguns lusos hipócritas rosnar que uma Catalunha independente seria prejudicial para a saúde da economia!… Dessa maldita economia que tanto nos determina.
E será que isto seria mesmo mau? E se a seguir fosse o País Basco, a Galiza, a Andaluzia e outras mais nacionalidades mantidas em letargia por Castela? E se Espanha se transformasse numa nova Jugoslávia que implodisse?
Num tal status quo as várias novas nações peninsulares olhariam para Portugal como o mano mais velho que se emancipou há mais tempo. E as relações comerciais e culturais entre os diversos povos da Ibéria sofreriam um boost fantástico.
Mas é claro que se algum importante membro da nossa sociedade alfacinha - sobretudo se algum político, no poder ou na oposição - se pronunciasse a favor de Carles Puigdemont, logo o Rei de Espanha actual teria de imitar o seu progenitor gritando de ladecos para trás das suas espaldas “¿Por qué no te callas?”.
Puigdemont nunca se poderia ter exilado aqui sem nos comprometer com este outro Rey Felipe do séc. XXI. O homem teve mesmo de ir para a Flandres, claro. Que por acaso também já soube o que era estar sob o jugo espanhol…
Eu cá sou apenas uma reles formiguinha. E por isso me permito escrever aqui neste pequenito púlpito que eu sou per una Catalunya lliure.
E que um dia num futuro não muito longínquo a terra do meu avô paterno - que eu nunca conheci, pois deixou este mundo quando o meu pai tinha a provecta idade de nove anos -, Santiago de Compostela, também tenha o seu destino apenas nas suas mãos.
Menos mal. No anno da graça de Mil Seiscentos e Quarenta não havia cá referendos. Eram tempos mais bárbaros. Hoje as coisas podem resolver-se com papelinhos enfiados em urnas.
Ainda que actualmente possamos parecer mais civilizados e sobretudo democráticos, persistem contudo umas pequenas bizarrias. Como delitos de opinião poderem condenar um homem a 30 anos de cadeia no país aqui ao lado de nuestros hermanos, por supuesto.
Não entendo como é possível que a lei fundamental de Espanha, a sua constituição, blinde a possibilidade das diferentes nações que a compõem, qual mosaico, julgarem unilateralmente acerca do seu destino. Como é que tal regra foi aprovada?… Como é que não a contestam hoje?…
Eu ao menos não ouço essas vozes, se é que existem. Nem essas lá em Barcelona, nem outras que deveriam clamar aqui em Lisboa pelo seu apoio por uma Catalunha livre… Então nós tivemos direito ao nosso 1640, à nossa restauração da independência face a esses reis Felipes merengues e não se ouve nenhum tuga dizer de sua justiça que os catalães deveriam merecer o mesmo?…
Só se ouve por aí alguns lusos hipócritas rosnar que uma Catalunha independente seria prejudicial para a saúde da economia!… Dessa maldita economia que tanto nos determina.
E será que isto seria mesmo mau? E se a seguir fosse o País Basco, a Galiza, a Andaluzia e outras mais nacionalidades mantidas em letargia por Castela? E se Espanha se transformasse numa nova Jugoslávia que implodisse?
Num tal status quo as várias novas nações peninsulares olhariam para Portugal como o mano mais velho que se emancipou há mais tempo. E as relações comerciais e culturais entre os diversos povos da Ibéria sofreriam um boost fantástico.
Mas é claro que se algum importante membro da nossa sociedade alfacinha - sobretudo se algum político, no poder ou na oposição - se pronunciasse a favor de Carles Puigdemont, logo o Rei de Espanha actual teria de imitar o seu progenitor gritando de ladecos para trás das suas espaldas “¿Por qué no te callas?”.
Puigdemont nunca se poderia ter exilado aqui sem nos comprometer com este outro Rey Felipe do séc. XXI. O homem teve mesmo de ir para a Flandres, claro. Que por acaso também já soube o que era estar sob o jugo espanhol…
Eu cá sou apenas uma reles formiguinha. E por isso me permito escrever aqui neste pequenito púlpito que eu sou per una Catalunya lliure.
E que um dia num futuro não muito longínquo a terra do meu avô paterno - que eu nunca conheci, pois deixou este mundo quando o meu pai tinha a provecta idade de nove anos -, Santiago de Compostela, também tenha o seu destino apenas nas suas mãos.
quarta-feira, 8 de novembro de 2017
• 100 anos
A Oktoberfest realiza-se em Setembro… E a Revolução de Outubro comemora-se a 7 de Novembro. Vá-se lá perceber porquê…
Bom, mas o que importa é que fez 100 anos ontem que o mundo começou a mudar. Nascia uma bela utopia. Que uma vez mais a condição humana haveria de matar. Como sempre fará com todas as utopias.
Rascas que são todos os humanos. Todos. Mesmo os que fazem revoluções que mudam tudo aqui debaixo do céu.
Rascas que são todos os humanos. Todos. Mesmo os que fazem revoluções que mudam tudo aqui debaixo do céu.
Ela e eu nascemos cerca de meio século depois. Quando a utopia liderava os seus numa intrépida corrida desta humanidade, para a levar ao espaço. Numa época em que estávamos em campos opostos e praticamente incomunicáveis.
Se a utopia não tivesse sido derrubada por terra talvez nós dois nunca nos viéssemos a encontrar nesta presente vida.
Ainda gostaria um dia de ouvir mais histórias que ela contasse dos tempos em que a utopia determinava a sua vida. Como eu contaria como foi a minha infância e adolescência sob um outro regime que também não me deixaria crescer para ser absolutamente livre.
Ou tão só livre ao ponto de como somos ambos livres hoje em dia. Livres de dizer o que quisermos e de ir onde quisermos.
Que a utopia dela se cumpra. Seja lá a que for.
Eu ainda ando à procura de qual será a minha.
segunda-feira, 30 de outubro de 2017
• Um dia rasca
A foto que vemos acima foi tirada por um bombeiro. Do terraço do seu quartel de bombeiros voluntários em Vieira de Leiria.
Quando li num jornal uma notícia ilustrada com esta foto, perguntei-me o que estaria um bombeiro a fazer no seu quartel em vez de estar a combater as chamas que avistava ao longe? Vi então que relatava-se que este bombeiro - Hélio Madeiras de seu nome, para atribuir os créditos à foto - teria estado justamente a tentar conter o fogo quando entretanto soube que seria destacado com um grupo de seus camaradas para ir acudir a outro grande incêndio em Vouzela, a cerca de 150 km da sua terra!… Como se isto fizesse grande sentido…
Terá sido então no intervalo entre um fogo e outro e regressado ao quartel que teve um momento para guardar para a posteridade a desgraça que se abatia sobre o Pinhal de Leiria.
Noutro jornal com uma outra notícia com a mesma foto, o seu nome de família perdeu o “s” final, passando ao singular, e tomou já outra categoria profissional: a de um “recuperador salvador da Autoridade Nacional de Proteção Civil”. Seja lá o que isso for…
Esta foto tornou-se viral nos media de todo este mundo que quiseram dar a nova do inferno na terra em que este pequeno país á beira-mar plantado se tornou naquele malfadado dia.
Duas semanas depois, movido por uma curiosidade mórbida, tornei-me um turista de terra queimada.
Tinha estado justamente na Praia da Vieira de Leiria no último dia do mês passado de Setembro e no primeiro dia deste. A gozar um curto período de paz interior. A reflectir sobre o sentido da minha vida e a postá-lo num dos meus blogs. Nesse lugar muito caro para mim.
Quis voltar lá para ver a extensão da destruição. E para me garantir que tudo se há-de erguer de novo.
Confio muito que de facto tudo se há-de erguer de novo. O negro vai dar lugar ao verde uma vez mais.
Só espero é que a rasquice e estupidez que grassou naquele dia 15, essa não volte a existir alguma vez mais.
Estupidez que por vezes podemos pensar que é um exclusivo ou uma característica muito ruga. Mas então como explicar que na poderosa Califórnia também tenham deixado que ardesse tanta floresta e morresse taxas vítimas como aqui?…
Que não tivessem conseguido salvar algumas das mais abastadas casas vinícolas deste planeta na famosa Napa Valley?…
E na Galiza!… E na Lombardia também houve incêndios nesta época em que não era suposto a natureza castigar-nos.
Mas enfim… Há lá algum momento que seja mais próprio para o castigo da estupidez humana?…
quinta-feira, 28 de setembro de 2017
• Morreu um cidadão rasca
De sua graça Hugh Marston Hefner, bateu hoje os tacões. E este blog não podia deixar de lhe prestar uma devida homenagem.
Uma outra alma, que julgo seria um bom amigo dele, se tivesse sido seu contemporâneo, disse um dia isto:
“Toda a gente morre. Mas nem toda a gente viveu.”
- Manuel Teixeira Gomes,
sétimo presidente da República Portuguesa
sétimo presidente da República Portuguesa
Este gajo, o Hefner, soube viver. É o que me apetece dizer sobre ele. Não o invejando muito por aí além, porque ele, presumo, só teria à sua beira “coelhinhas” e eu não desdenho “real people”, isto é, fofinhas… Não o invejando, dizia eu, gostaria no entanto de ter um dia a sua fama de “unconventional gentleman”. À minha maneira.
O site da Playboy tinha hoje, apenas e só, uma foto sua - enquanto quarentão ou cinquentão, não sei precisar - com o seu proverbial cachimbo e com esta citação abaixo, que lhe é atribuída. Mais nada.
“Life is too short to be living somebody else’s dream."
- Hugh Hefner
És capaz de ter razão, Hugh. És bem capaz de ter razão.
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P.S.: E porque a Playboy é uma revista onde o humor é um ingrediente essencial e isto que vou partilhar a seguir não pode passar de hoje, senão corre-se o risco de perder impacto e piada... Não tendo mesmo absolutamente nada a ver com o Hugh Hefner, mas enfim... Isto é uma blague só cá para o burgo... Enfim, cá vai!...
Após a partida de ontem entre o FC Basel e o Sport Lisboa e Benfica para a Champions League, a Emirates pondera retirar o patrocínio das camisolas do "glorioso". Mas o SLB já tem uma outra big corporation interessada em vigorar ao peito da troupe de circo das denominadas "papoilas saltitantes". Que é esta:
quinta-feira, 31 de agosto de 2017
segunda-feira, 31 de julho de 2017
• No lo han logrado
Nos últimos tempos, e graças à minha labuta árdua, tenho tido a felicidade de descobrir mais alguns recantos deste país onde nasci que ainda faltavam no meu curriculum vitae geográfico.
E em cada novo lugar onde vislumbro uma súbita alegria e um querer de lá viver, uma ideia me assalta…
A de que os aprendizes de feiticeiro que por acaso do destino desta nação tiveram a desdita de o governar, com a sua política de terra queimada e de empobrecimento, não chegaram a conseguir dar cabo da arte de viver em Portugal.
sexta-feira, 30 de junho de 2017
• Já não é como antigamente...
A silly season, digo. Já não é como antigamente. Ou então sou eu que já nem ligo pevide à política tuga.
Mas de quando em vez, e porque ainda vejo alguns noticiários na pantalla cá de casa - raramente, sim, mas vejo -, lá tenho de reparar nas invariavelmente pobres intervenções públicas de um alegado líder da oposição ao actual governo, a quem a vidinha não deve andar a correr mesmo nada, nadinha de feição...
Mas de quando em vez, e porque ainda vejo alguns noticiários na pantalla cá de casa - raramente, sim, mas vejo -, lá tenho de reparar nas invariavelmente pobres intervenções públicas de um alegado líder da oposição ao actual governo, a quem a vidinha não deve andar a correr mesmo nada, nadinha de feição...
Vou começar a ter pena de Pierre Pas Lapin.
segunda-feira, 29 de maio de 2017
• Agora reparo...
Tudo tem sido pró fixe no Portugalito desde que a geringonça apeou do poder executivo os aprendizes de feiticeiros.
E isto tanto nesse mundo de fantasia que é a macroeconomia - sim, que isto dos mercados, agências de ratings e demais cenas da alta finança é coisa que a maioria de nós nem podemos cheirar o quanto fede - como na vida real e palpável ao Zé Povinho.
Ele é os indicadores económicos a evoluir lenta mas favoravelmente, sobretudo esse fantasma do défice. Ele é as pessoas a consumir mais e com suficiente despreocupação. Ele é o turismo a crescer em flecha, essa parcela hoje tão relevante das nossas exportações, como jamais se vinha vendo…
E depois na vida quotidiana vemos êxitos inéditos, assim de repente e em catadupa, como nos nossos mais ousados sonhos. Nas artes e no desporto, por exemplo. Como as súbitas consagrações do nosso talento particular na Eurovisão e no futebol. E noutras áreas.
É Portugal a estar na moda junto da opinião pública de tantos outros países deste mundo. É a felicidade estampada nos rostos de quem nos visita. Que nos contagia e nos faz pensar que esta pode ser, afinal, uma terra bendita.
Isto tudo deve ser tão duro de engolir áqueles que por incompetência, ignorância e inabilidade tanto fizeram por que a Felicidade Nacional Bruta fosse sacrificada ao Produto Interno Bruto…
É um argumento clássico nos filmes yankees: vemos tantas vezes nessa sociedade tão competitiva como a norte-americana a turma dos certinhos, betinhos, graduados em Harvard serem batidos no fim pelos toscos, que passam o filme todo a ser humilhados, troçados e vencidos pelos primeiros. Mas no final a vitória é dos pobres coitados que fazem das fraquezas forças.
Tantos execráveis personagens andaram a gozar com esse banana que era o Mário Centeno… Que o destino lhes serviu umas bofetadas com luvas de pelica, bem dadas por sinal.
Também temos de agradecer a uma providência divina termos hoje um árbitro a sério. Um amigo e pedagogo. Marcelo, não páres!… Não deixes de ser quem és, apesar de certas vozes, das quais sempre se disse que não chegam ao céu.
Acho que podemos todos dizer que o pesadelo acabou.
sábado, 29 de abril de 2017
• Cosmos Discovery - a exposição
- E porque é que nunca mais fomos outra vez à Lua?…
Eis a dúvida naturalíssima da minha filhota, que nasceu bem depois dessa corrida ao nosso satélite, promovida entre a ex-União Soviética e os Estados Unidos da América, enquanto eu e ela visitávamos a Cosmos Discovery Lisboa e nos deslumbrávamos com relatos e artefactos de façanhas da nossa humanidade que foram mais minhas contemporâneas.
Eis a dúvida naturalíssima da minha filhota, que nasceu bem depois dessa corrida ao nosso satélite, promovida entre a ex-União Soviética e os Estados Unidos da América, enquanto eu e ela visitávamos a Cosmos Discovery Lisboa e nos deslumbrávamos com relatos e artefactos de façanhas da nossa humanidade que foram mais minhas contemporâneas.
- Porque entretanto os economistas passaram a dominar este mundo. - retorqui eu, resignado.
E é triste que tal tenha acontecido. Os economistas são os eucaliptos da humanidade. Secam toda a iniciativa que não vise o lucro puro e duro. A economia é a área das ciências que trava todas as outras e em consequência, o avanço da civilização terráquea.
Oxalá que esta exposição itinerante por várias capitais deste mundo e que aterrou por agora aqui em Lisboa - em Belém, lugar que evoca outras epopeias de descobertas doutros tempos bem mais vindouros - inspire algum ser que venha a evoluir para crescer como um novo político da estirpe de um John Fitzgerald Kennedy. E que este ciclo seja revertido antes que cheguemos a uma nova idade média do conhecimento científico.
Maldita economia, que nem ciência exacta se deveria considerar ser. É no meu entender mais uma arte divinatória, como a astrologia. E a astronomia é que importava desenvolver.
“We are all in the gutter, but some of us are looking at the stars.”
- Oscar Wilde
E os contabilistas só sabem olhar para baixo, para os numerozinhos vomitados em continhas de somar e subtrair nos rolos de papel que as suas arcaicas calculadoras vão desenrolando, acrescento eu...
sexta-feira, 24 de março de 2017
• O essencial
Isto é notório nas suas acções e palavras. Enquanto uns grandes se descuidam a dizer merdas, outros, pequenos, acreditam que têm por missão fazer merda.
Outros há ainda, a esmagadora maioria, que só querem tratar das suas vidinhas. E se alguma merda - leia-se contratempo - desvia estas formigas do seu carreiro alguns metros ou segundos daquilo que lhes é habitual, em vez de olharem o lado positivo - um súbito intervalo nas suas chatas rotinas - só se queixam de consequências menores do incidente entretanto ocorrido.
Os seres humanos estão a perder a capacidade de ver com o coração. Estão a esquecer de amar.
E não é só de se amarem uns aos outros. É de amarem também as pedras no caminho, essas sementes de castelos.
Sinto-me hoje a divergir tanto e cada vez mais da raça humana, em cujo seio nasci. E se eu também estou a deixar de amá-la, queria ao menos ainda encontrar algum elemento como eu a quem amar. Para não ter só amor próprio.
Eu já amei a alguém. Julgo que ainda amo a esse alguém. Mas hoje amo sozinho. O meu bem-querer deixou de ser essencial, como já foi. E é preciso viver e deixar viver.
sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017
• O ano do Galo
Já lá vai mais de uma semana. Foi no passado dia 28 de Janeiro do “nosso” Calendário Gregoriano que os povos do chamado Império do Meio entrou no ano do Galo.
Bom, isto é um evento que se repete de 12 em 12 anos. Nada de muito transcendental até aqui. Mas houve algo em que os chineses passaram a reparar um pouco mais desta vez…
A região administrativa especial de Macau, desde o final do século passado sob a alçada da República Popular da China, absorveu e virtualmente tornou como seu um símbolo deste país onde nasci: o Galo de Barcelos.
Nos últimos anos tornou-se um souvenir assaz procurado entre os turistas que visitam Macau.
Entre estes visitantes a grande maioria é originária da mainland China. E esta gente redescobriu agora este curioso galo feito de barro e desatou a comprar esta peça de artesanato como se fossem pastéis de nata quentinhos.
Entre estes visitantes a grande maioria é originária da mainland China. E esta gente redescobriu agora este curioso galo feito de barro e desatou a comprar esta peça de artesanato como se fossem pastéis de nata quentinhos.
Será isto um bom presságio para este ano na Lusitânia?… Oxalá que sim. Mas mesmo esses eventuais bons ventos não me impedirão, porventura, de trocar estas paragens por outras do longínquo Oriente.
É lá que prevejo fazer um reset à minha existência e reiniciar uma cidadania de forma sã e útil.
terça-feira, 24 de janeiro de 2017
• La mort de Louis XIV - o filme
“Est-ce vraiment nécéssaire?”, perguntava o Rei-Sol, Louis XIV, a dada altura neste filme a que em boa ou má hora escolhi gastar o meu tempo indo assistir…
Acabava de lhe ser proposto um projecto para a construção duma ponte, algures no oeste da França. O arquitecto inglês que defendia esse projecto afirmava que esta dita ponte deveria ter uma fortificação em cada um dos seus extremos, para a segurança do acesso à travessia da mesma.
A coisa só por aqui já bem que começava a cheirar a esturro… Mas o principal mentor da urgência da construção desta ponte - um nobre que se presumia ser frequentador assíduo da corte do Rei-Sol e o responsável pela escolha daquele arquitecto inglês - ainda quis acrescentar mais um argumento para que o rei percebesse que havia uma janela de oportunidade para a feitura daquela obra.
Esse argumento não era mais do que isto: o fornecimento da pedra, matéria-prima para aquela obra, já estaria assegurada e a um preço barato. Só que era preciso transportar essa pedra do rio Nilo para França. E para esse custo adicional era premente desbloquear verbas, algo que só o Rei poderia fazer.
Ora, o Rei estava já na curva descendente dessa decadência que o haveria de conduzir em passo algo acelerado para o seu último suspiro. Mas ainda lhe restava alguma lucidez. E portanto, protelou a sua decisão final sobre o assunto.
E eu questiono-me e reparo… Que espantosa ironia!… Este filme quis expôr como é que acontece - sempre aconteceu… - assim tanto esbanjamento de fundos públicos. Mas para a feitura deste mesmo filme também alguém teve de convencer outro alguém a desbloquear fundos públicos!!!…
Eu abomino o ritmo cinematográfico frenético - às vezes a roçar a parvoíce - das grandes produções de Hollywood. Mas ritmos demasiado lentinhos também não me divertem nadinha.
Ok, vão-me dizer que aquilo é arte. Que tem de ser totalmente descomprometida com qualquer noção de entretenimento. Que não tem de entreter mas ser superior a nós todos.
Balelas!… Caca de boi*!… É que se fosse só as cenas e a sua interpretação pelos actores a arrastarem-se à velocidade de preguiças em suposta hibernação ainda vá que não vá!… O pior é que…
O pior é que 99% das cenas do filme passam-se sempre no mesmo cenário. O quarto onde o Rei mal se levanta da cama. Excepto a primeira cena, que é um exterior, como mostrado na foto ao lado.
E tudo é filmado com aquela iluminação bem fraquinha, bem pobre, que desperdiça todo o trabalho de guarda-roupa e caracterização de actores em que se terão investido horas e horas a fio para nada!… E como tempo é dinheiro…
E tudo é filmado com aquela iluminação bem fraquinha, bem pobre, que desperdiça todo o trabalho de guarda-roupa e caracterização de actores em que se terão investido horas e horas a fio para nada!… E como tempo é dinheiro…
Mas em defesa da arte há que afirmar que isso é intencional. Para calar a crítica de qualquer ignorante como eu. Ou de inocentes miúdos que são os únicos a ver e no mesmo momento dizer que o Rei vai nu.
Enquanto me martirizava forçando-me a assistir a todo o filme, do princípio ao fim deste, só me vinha ao pensamento este desabafo: “Volta, Manoel de Oliveira, estás perdoado.”.
Eu mexo-me nos bastidores da sétima arte. Eu vejo como as coisas se passam. Eu vejo o desperdício constante de recursos e de talentos em façanhas tão vãs e efémeras.
Estou mesmo a ver técnicos de iluminação e fotografia a montar no décor inúmeras baterias de lâmpadas potentes, para depois esbater a sua luz a um mínimo, com carradas de filtros difusores. Why they put there so many light sources in the first place, I ask myself???…
Estou mesmo a ver a produção deste filme a arrendar espaços e mais espaços para as filmagens, para depois só se aproveitar na mistura final as cenas de um único set, quase exclusivamente.
Estou mesmo a ver exércitos de equipas técnicas e de figuração arregimentados para esta produção, para depois do sumo bem espremido não se aproveitar quase nada do esforço e do suor de todos e cada um destes.
Eu mesmo dei o meu tempo durante um dia inteiro e mais uma boa parte de outro para a feitura de um filme, de seu título “Zeus”. E a somar ao meu tempo há também o tempo de responsáveis pelo guarda-roupa e caracterização que se ocuparam afanosamente de mim. Para tudo isto se resumir à minha aparição durante um ou dois fugazes segundos. E vá lá, vá lá…
Também sou daqueles pretensos cinéfilos - ou cinerastas, como uma amiga minha diz - que assistem em sala aos filmes projectados até ao fim. Até ao final de todo o genérico e ficha técnica desenrolados. Até as luzes da sala estarem ligadas na máxima potência, convidando ao abandono do recinto.
Vejo sempre aquelas listas enormes de nomes que foram envolvidos na produção daquela peça da dita sétima arte e invariavelmente pergunto-me, como Louis XIV… Est-ce vraiment nécéssaire? Toda esta gente?… Não se podia ter dispensado o concurso de alguns deles, em nome de algum racionalismo?
Era mesmo preciso ir comprar a pedra ao Nilo? E construir além da ponte duas fortificações?…
Quis-se fazer alguma coisa para comemorar os 300 anos da morte do Rei-Sol, o monarca que reinou durante mais anos uma nação grande da história universal como a França. E a montanha pariu este rato.
E são sempre assim, afinal, as empresas dos humanos. Caríssimas e vãs. Desde as faraónicas pirâmides do Egipto até ao magnifique cinema de autor premiado em Cannes. Como caríssimas e vãs foram também existências que depois glorificamos. Como a de Louis XIV. E de tantos outros que tais…
E já podíamos todos ter aprendido tanto, ao longo do caminho que a humanidade já percorreu… A pobreza e a miséria já podiam ter sido erradicadas. Como a varíola o foi.
Ocorrem-me agora mesmo - nem sei se bem a propósito, mas enfim, eu também digo que sou um artista... - as palavras de Eugénio de Andrade, no seu poema “Não é verdade”…
Não é verdade tanta loja de perfumes,
não é verdade tanta rosa decepada,
tanta ponte de fumo, tanta roupa escura,
tanto relógio, tanta pomba assassinada.
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* Tradução literal do comum vocábulo “Bullshit”, tão empregado entre os yankees.
terça-feira, 10 de janeiro de 2017
• Obrigado
Ontem fui ao Mosteiro dos Jerónimos ver o seu corpo em repouso. Já não entrava naquele claustro desde que era um teenager em visita de estudo. E ali ontem percebi que tenho de permitir mais amiúde que esses viajantes que até ali venho trazendo entrem e se sintam tão embasbacados como eu fiquei ao rever o lugar depois de tantos anos.
Com as suas cerimónias fúnebres antes da ida para o cemitério a terem lugar nos Jerónimos, ele deu-me, para além de outras mais essenciais, uma derradeira oferta. Que foi a de poder entrar naquele monumento tão visitado por forasteiros, sem pagar o balúrdio que a estes últimos - e aos nativos desta Olissipo, também… - exigimos.
No velório no antigo refeitório do mosteiro ele lá estava naquela pose dos grandes entre todos nós. Levou-me a pensar no momento que todos os povos têm o seu Mao Zedong. Ou o seu Kim Il-Sung. Ou o seu Enver Hoxha. O seu querido líder, enfim.
Só que ele não era dessa linhagem de chefes de estado. Era mais um Olof Palme. Ou um Nelson Mandela. Um bacano. Um gajo même fixe.
A ele devo o poder estar a escrever estas linhas sem recear o que a ele fizeram. Isto é, engaiolaram-no.
A mim isso só virá um dia a acontecer se isto ainda der um grande virote para trás. Mas eu acredito que vidas como a que ele viveu e nos mostrou como viver não permitirá que tal suceda jamais, doravante. É esse o seu grande legado para todos nós.
Obrigado, Mário. Descansa em paz agora, que creio que nós todos aprendemos a tua lição.
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