terça-feira, 17 de março de 2020

• Codivarius*

A Al-Qaeda não teria feito melhor!…

A Al-Qaeda ou outra qualquer organização terrorista ou extremista, real ou fictícia**, não teriam feito melhor que este novo Coronavírus, se alguma vez tivessem planeado e executado um esquema maléfico para causar esta colossal reviravolta no mundo de hoje.

Sim, eu acredito em teorias da conspiração. Não, eu não acredito que tudo isto começou na cidade de Wuhan por acaso. Não, eu não acredito que há que forçosamente apontar o dedo aos chineses, quando chegar a hora de descobrir culpados ou responsáveis. Sim, eu acredito que pode ter havido uma mão invisível por detrás disto tudo.

No entanto, apesar deste meu pensamento desviante, venho hoje aqui dar maior divulgação a outra forma de pensar, mais positiva e despoluída. Quero, portanto divulgar a reflexão mais inteligente sobre toda esta crise que já vi até agora!...

O texto original em italiano pode ser consultado, clicando aqui.

Abaixo, este blog vai fazer uma beka de serviço público, reproduzindo a tradução em português e, também, em inglês, uma vez que ainda não vislumbrei nenhum anglófono internauta a prestar a devida atenção ao que disse Francesca Morelli, psicóloga italiana, no dia 10 do corrente mês de Março.

Aqui vai, primeiro em português:

Isto é o que o vírus está nos explicando
de Francesca Morelli

10 de Março de 2020
Fique em casa, dias e dias. Para lidar com um período em que perdemos valor, se não for mensurável em compensação, em dinheiro. Ainda sabemos o que fazer com isso? Paramos de caçar bruxas, imaginando quem é o culpado ou por que tudo isto aconteceu, mas nos perguntamos o que podemos aprender com isto. Por exemplo...

Acredito que o cosmos tem o seu jeito próprio de reequilibrar as coisas e as suas leis quando são viradas de cabeça para baixo.

O momento que estamos vivendo, cheio de anomalias e paradoxos, faz-nos pensar...

Numa época em que as mudanças climáticas causadas por desastres ambientais atingiram níveis preocupantes, a China em primeiro lugar e muitos países a seguir são forçados a bloquear; a economia entra em colapso, mas a poluição diminui consideravelmente. A qualidade do ar melhora, usamos máscaras, mas podemos respirar melhor…

Em um momento histórico em que certas ideologias e políticas discriminatórias, com fortes referências a um passado mesquinho, estão se reativando em todo o mundo, chega um vírus que nos faz experimentar que, em um momento, podemos nos tornar os discriminados, segregados, aqueles presos na fronteira, aqueles que carregam doenças. Mesmo se não tivermos a culpa. Mesmo se somos brancos, ocidentais e viajamos em classe executiva.

Em uma sociedade baseada na produtividade e no consumo, na qual todos corremos 14 horas por dia, não sabemos exatamente porquê, sem sábados ou domingos, sem mais vermelhos do que o calendário, a qualquer momento a parada chega.

Páre em casa, dias e dias. Para lidar com um período em que perdemos valor, se não for mensurável em compensação, em dinheiro. Ainda sabemos o que fazer com isso?

Numa fase em que o crescimento de nossos filhos é necessariamente delegado a outras figuras e instituições, o vírus fecha as escolas e nos obriga a encontrar soluções alternativas, a colocar mães e pais junto com seus filhos. Nos obriga a reconstruir a instituição família.

Numa dimensão em que as relações, a comunicação e a socialidade são desempenhadas principalmente no "não-espaço" do virtual, da rede social, dando-nos a ilusão de proximidade, o vírus tira o verdadeiro da proximidade, o real: que ninguém se toca, sem beijos, sem abraços, à distância, no frio do não-contacto.

Quanto tomamos como certo estes gestos e o seu significado?

Numa fase social em que o pensamento sobre o nosso jardim se tornou a regra, o vírus nos envia uma mensagem clara: a única saída é a reciprocidade, o sentimento de pertença, a comunidade, o sentimento de fazer parte de algo mais importante para cuidar de e que você pode cuidar de nós. A responsabilidade compartilhada, a sensação de que o destino depende não apenas de nós, mas também de todos ao nosso redor. E que dependemos deles.

Então, se pararmos de caçar bruxas, nos perguntando quem é o culpado ou porque tudo isto aconteceu, mas nos perguntarmos o que podemos aprender com isto, acho que todos temos muito em que pensar e nos comprometer.

Porque com o cosmos e suas leis, obviamente, estamos em profunda dívida. O vírus está explicando isto para nós, a um preço alto.

And now, for something completely different, in english:

This is what the virus is explaining to us
by Francesca Morelli

March 10, 2020
Stay at home, days and days. To deal with a time of which we have lost value, if it’s not measurable in compensation, in money. Do we still know what to do with it? We stop hunting witches, wondering who is to blame or why all this happened, but we wonder what we can learn from this. For example...

I believe that the cosmos has its way of rebalancing things and its laws when they are turned upside down.

The moment we are experiencing, full of anomalies and paradoxes, makes you think...

At a time when climate change caused by environmental disasters has reached worrying levels, China in the first place and many countries to follow, are forced to blockade; the economy collapses, but pollution drops considerably. The air quality improves, we use masks, but we can better breathe...

In a historical moment in which certain discriminatory ideologies and policies, with strong references to a petty past, are reactivating all over the world, a virus arrives that makes us experience that, in a moment, we can become the discriminated, the segregated, those stuck at the border, those who carry disease. Even if we are not to blame. Even if we are white, western and we travel in business class.

In a society based on productivity and consumption, in which we all run 14 hours a day, we don't know exactly what, without Saturdays or Sundays, without more reds than the calendar, at any moment, the stop comes.

Stop at home, days and days. To deal with a time of which we have lost value, if it is not measurable in compensation, in money. Do we still know what to do with it?

In a phase in which the growth of our children is, necessarily, often delegated to other figures and institutions, the virus closes schools and forces us to find alternative solutions, to put moms and dads together with their children. It forces us to rebuild the institution family.

In a dimension in which relationships, communication and sociality are played mainly in the "non-space" of the virtual, of the social network, giving us the illusion of closeness, the virus takes away the true one of closeness, the real one: that nobody touch each other, no kisses, no hugs, at a distance, in the cold of non-contact.

How much have we taken these gestures and their meaning for granted?

In a social phase in which thinking about one's garden has become the rule, the virus sends us a clear message: the only way out is reciprocity, the sense of belonging, the community, the feeling of being part of something more great to take care of and that you can take care of us. The shared responsibility, the feeling that the fate depends not only on us but also on everyone around us. And that we depend on them.

So if we stop hunting witches, wondering who is to blame or why all this has happened, but we wonder what we can learn from this, I think we all have a lot to think about and commit to.

Because with the cosmos and its laws, obviously, we are in deep debt. The virus is explaining it to us, at a high price.

Complementarmente, podem escutar uma vez mais esta mensagem num vídeo com legendas e locução em espanhol, clicando aqui.

Vá, já que temos todos - todos menos quem trabalha em hospitais - muito tempo disponível de repente, vamos lá reflectir sobre o sentido da vida.

Esta crise está a obrigar-nos a pensar melhor em como gastar o nosso tempo, bem muito precioso.

Afinal, andamos todos a correr para quê?...

Tu e eu estamos a ir todos os dias trabalhar para quê? O valor do nosso trabalho é hoje em dia tão rapidamente dispensado em face de valores mais altos, como a saúde colectiva da comunidade em que vivemos.

Quão vãs são tantas actividades humanas nos dias de hoje… Até esta azáfama deste insano blogger é vã. 
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* “Codivarius” é igual a “Coronavírus”, na linguagem da senhora minha mãe, que sempre teve esta mania de renomear certas buzzwords que entram na moda no nosso linguajar comum.

** Digo fictícia porque sempre suspeitei que a dita Al-Qaeda nunca passou de um nome que era preciso dar a um bode expiatório que tinha de ser inventado e apontado, para justificar actos apaziguadores de opiniões públicas sedentas de vinganças.